Fazendeiros aceitam títulos da dívida agrária para pagar terras em Mato Grosso do Sul

Pio Redondo

 


O Ministério da Justiça, na figura do ministro José Eduardo Cardozo,e a Secretaria-Geral da Presidência da República, com o secretário Gilberto Carvalho,devem apresentar nessa terça-feira (13) em reunião do Fórum para Demarcação de Terras Indígenas, em Campo Grande, um cronograma às lideranças rurais e indígenas e autoridades estaduais, demonstrando como e quando o governo federal colocará em prática o processo de compra de fazendas listadas como prioritárias para apaziguar um conflito pela posse de terras no MS. 
A principal discussão se dará sobre a forma da compra das terras por um mecanismo que envolve, diretamente, uma operação conjunta entre a União e o Estado. Trata-se da emissão de TDAs (Títulos da Dívida Agrária) pelo governo federal ao governo do MS, que os descontará no mercado de títulos. Com o recurso arrematado,o governo Puccinelli comprará à vista as terras dos fazendeiros que serão desapropriados.
O uso de TDAs foi acatado por unanimidade em reunião do Fórum, ocorrida no último dia 7 (quarta-feira) no Ministério da Justiça, em Brasília, entre o ministro Cardozo,produtores rurais, lideranças  indígenas, Ministério Público Federal, Conselho Nacional de Justiça, governo estadual e prefeitos.
Presente ao encontro, a vice-governadora Simone Tebet ratificou a decisão coletiva. Ali também estavam os secretários de Estado de Produção e Turismo (Seprotur), Tereza Cristina Corrêa da Costa Dias, e de Justiça e Segurança (Sejusp), Wantuir Jacini.
Mesmo assim, durante a reunião, segundo alguns dos presentes, o ministro da Justiça telefonou diretamente para o governador André Puccinelli, expondo a decisão colegiada.
Lindomar Ferreira, liderança indígena terena, informou que “no telefonema o ministro explicou como seriam os encaminhamentos, citando a TDA, e disse ao governador que só faltava a palavra final dele”. 
“Houve concordância do governador, segundo informou o ministro aos presentes”, afirma Lindomar. A mesma informação vem de Chico Maia, presidente da Acrisul (Associação dos Criadores do MS).
Ao final da reunião, o ministro da Justiça declarou que “haverá total segurança jurídica para ambas as partes”, salientando que aquela  foi “a primeira porta para a pacificação da questão indígena no Brasil”.
No dia seguinte, porém, em entrevista coletiva, o governador colocou dúvidas sobre o uso dos títulos, já acordado no dia anterior.”Tem que ver se produtores e índios aceitam a proposta. TDA não é dinheiro”, ponderou. 
Segundo Chico Maia, “o problema é que TDA tem deságio no mercado de títulos, que pode chegar a uns 15. E aí o governo do MS teria que bancar a diferença”.
Mas não é só: especula-se que muitos fazendeiros que terão áreas indenizadas possuem dívidas com o Estado ou com a União, e esse valor poderia ser descontado da indenização final das terras e benfeitorias, um fato que provoca incertezas.

Luis Alberto
 

O advogado  Famasul (Federação da Agricultura e pecuária do MS), Gustavo Passarelli, declarou ao Midiamax que a entidade que reúne produtores não vê problemas com o uso de TDA. 
“Realmente, não se trata de uma solução simples. Mas é uma alternativa viável do ponto de vista jurídico.  É possível  fazer, mas depende de um acordo entre União e Estado. TDAtem boa aceitação e liquidez no mercado”.
Para o advogado, “as dificuldades que podem ocorrem no meio do caminho não pode ser suficiente para tirar o brilho da iniciativa.  Um acordo que inclui terra nua era algo impensável em 2008. A partir de amanhã vamos discutir a operacionalização da proposta, para que cada produtor se posicione com clareza sobre sua adesão ou não ao acordo geral”.
Desapropriações serão feitas por etapas
A área mais imediata a ser comprada é a chamada de Terra Indígena Buriti, em Sidrolândia, com 15 mil hectares, formada por 31 fazendas. Depois do acordo concluído,  deve passar para 17.200 ha reivindicados pelas terenas.Em uma das fazendas, a Buriti, morreu Oziel Gabriel, depois de levar um tiro fatal em desocupação promovida pela Polícia Federal.
Ali, desde 2003, há um laudo antropológico da Funai (Fundação Nacional do Índio) favorável aos indígenas. 
Produtores rurais estimam que o preço da terra em Sidrolândia seja de R$ 15 mil por ha, o que significaria um custo de R$ 225 milhões para os 15 mil ha. Mas o governo federal tem outros números, algo entre R$ 7 mil a R$ 10 mil por ha. Um levantamento detalhado, por fazenda, definirá o custo de cada uma delas para efeito de compra.
Em outra região, conhecida como Terra Indígena Sombrerito, situada em Sete quadras, na macrorregião de Dourados, o conflito se acirrou desde 2005, com o assassinato Dorival Benites, um dos líderes Guarani-Kaiowá.
Em março deste ano, uma decisão unânime da Primeira Seção do STJ (Superior Tribunal de Justiça) garantiu a posse permanente do grupo Guarani Nhandeva sobre uma área superior a 1.275 hectares, que compõem o imóvel a Fazenda Santa Alice.
No município de Antônio João está a terceira área a ser desapropriada, a Terra Indígena Ñande  Ru Marangatu.  São mais 9.316 hectares homologados para os Guarani Kaiowás emmarço de 2005, depois de um logo conflito entre índios e fazendeiros.
Em todas as três áreas, houve grandes pendências judiciais, confrontos, ocupações e reintegração, seguidas de novas ocupações. 
Ao todo, 53 áreas estão em disputa no estado
Se o número 53 áreas em conflito no MS resultasse em desapropriação pelo governo federal, o custo pelo pagamento de seus 815.872,00 hectares ultrapassaria R$ 1 bilhão, segundo cálculos de entidades ligadas aos produtores rurais.
Desse total, o Comitê Executivo Nacional do Fórum de Assuntos Fundiários, vinculado ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça), elencou nove áreas que carecem de solução emergencial para por fim aos conflitos no MS.
Foram listadas para fins de ampliação as reservas Cachoeirinha (Miranda), Taunay Ipegue (Aquidauana), Buriti (Sidrolândia), Panambi (Dourados e Itaporã), Ñande Ru Marangatu (Antônio João), Potrero Guaçu (Paranhos), Taquara (Juti), Tekoha Ypoi (Paranhos), Arroio Korá (Paranhos), que formam uma espécie de cinturão entre Miranda, no Pantanal, até Paranhos, sul do estado, divisa com o Paraguai.
Por enquanto, o governo federal inicia a negociação das três áreas que considera mais emergencial.