A base vem como? Seleção soma frustrações no sub-17 e sub-20, mas nem tudo está (tão) perdido

Por Lucas Loos — Rio de Jan

A base do futebol brasileiro vive um momento, no mínimo, de reflexão. No sub-20, a Seleção vem de quatro Sul-Americanos abaixo das expectativas, três deles que custaram a vaga no Mundial da categoria (fato raro na história, como você verá mais adiante). O alento estava na categoria sub-17, onde a seleção vinha de dez conquistas nas últimas 12 taças continentais. Isso até o último sábado, quando o o time brasileiro se viu eliminado na primeira fase da competição de forma inédita.

– O Sub-17 agora conseguiu o milagre de ficar entre os quatro piores. Nosso nível virou Bolívia, Venezuela, e é o nosso futuro. Os nossos meninos, é claro, lutaram, correram, mas não chegaram lá. Por que desde a base estamos vendo que os adversários não temem mais o Brasil? – questionou Galvão, no “Bem Amigos” da última segunda-feira.

Fato é que nos últimos quatro sul-americanos, a melhor campanha do Brasil no Sub-20 foi o quarto lugar em 2015. Em 2013, a a eliminação na primeira fase quebrou a sequência da seleção que havia chegado a quatro títulos e dois vices em seis sul-americanos consecutivos. A perda da vaga para o Mundial virou rotina, pois foi assim em 2017 e neste ano, restando à seleção a quinta colocação nos torneios.

O choque de realidade na sub-20

Campanhas do Brasil neste século no Sul-Americano da categoria

2001 2003 2005 2007 2009 2011 2013* 2015 2017* 2019*
Campeão Vice Vice Campeão Campeão Campeão Primeira fase Quarto Quinto Quinto

* anos em que a Seleção Sub-20 ficou fora do Mundial. Antes disso, o Brasil não havia se classificado apenas uma vez, em 1979.

Campanhas do Brasil pós-1979 no Sul-Americano da categoria

1981 1983 1985 1987 1989 1991 1993 1995 1997 1999
Vice Campeão Campeão Vice Campeão Campeão Campeão Campeão Vice Terceiro
Última grande campanha da Seleção Sub-20, em 2011, com Neymar, Lucas, Casemiro e companhia — Foto: Mowa Press

Última grande campanha da Seleção Sub-20, em 2011, com Neymar, Lucas, Casemiro e companhia — Foto: Mowa Press

No Sul-Americano de 2015, o Brasil de Marcos Guilherme, Gabigol e Malcom só conseguiu a classificação na bacia das almas, com a quarta colocação. Mas no Mundial foi até a final e só não levou o título mundial na Nova Zelândia porque perdeu da Sérvia na prorrogação. Chegamos a 2017, a vaga no Mundial mais uma vez escapou, só que aquela geração deixou de herança, por exemplo, Lucas Paquetá, Richarlison e David Neres, todos na última lista de Tite.

– Eu acho que muitas vezes você tira lições positivas da derrota, até maiores. Não estou falando que perder é bom. Mas vou te dar um exemplo: a geração nascida em 93 foi campeã olímpica, mas antes não se classificou para o Mundial Sub-20 pela primeira vez em anos. Sentiram a dor da derrota, depois tiveram nova oportunidade e ganharam. Então, tem como tirar proveito – explica o técnico Rogério Micale, campeão olímpico em 2016, em entrevista ao GloboEsporte.com.

Brasil caiu diante da Argentina no último Sul-Americano Sub-20 — Foto: EfeBrasil caiu diante da Argentina no último Sul-Americano Sub-20 — Foto: Efe

Brasil caiu diante da Argentina no último Sul-Americano Sub-20 — Foto: Efe

Paramos no tempo?

Rogério Micale tem conhecimento do assunto. Ele assumiu o lugar de Gallo depois da quarta colocação em 2015 e depois levou a Seleção ao vice-campeonato mundial. A campanha valeu a oportunidade de comandar o Brasil nos Jogos do Rio – e o ouro olímpico o elevou a outro patamar. Só que no ano seguinte amargou a quinta colocação no Sul-Americano, a vaga no Mundial escapou mais uma vez, e Micale caiu. Entre os diagnósticos, ele aponta a falta de continuidade, assim como a ausência de um trabalho em conjunto com os clubes.

– Se não deu certo, tem que treinar mais, buscar soluções. Não só buscar a mesma coisa. O Brasil conseguia dessa forma antigamente, mas isso acacou. Hoje você vê a Venezuela, vice-campeã mundial sub-20. Cresceram também Equador, Colômbia… O Chile, que não vem conseguindo resultados, tem um excelente modelo para a base. Eles treinam de segunda à quarta na seleção e só depois voltam para o clube – diz Micale, que completa.

“O Brasil acha que tem que ganhar porque sempre foi bom. Mas paramos no tempo. Na base, também estamos sofrendo”.

Micale conduziu o Brasil e Neymar e Gabriel Jesus ao ouro em 2016 — Foto: Agência ReutersMicale conduziu o Brasil e Neymar e Gabriel Jesus ao ouro em 2016 — Foto: Agência Reuters

Micale conduziu o Brasil e Neymar e Gabriel Jesus ao ouro em 2016 — Foto: Agência Reuters

Para Micale, a cobrança por resultados acaba prejudicando a seleção sub-20… nos resultados. Na sub-15 e sub-17, jogadores em idades ímpares, mais velhos e de maior força física, levam preferência. Quando sobem para a sub-20, a situação muda, e a preferência seria por atletas de anos pares. Isso, segundo o treinador campeão olímpico, não acontece com outras seleções cujo objetivo é a continuidade de um trabalho.

– A eliminação sub-17 foi uma surpresa, que vinha tendo bons resultados. A sub-20 vem deixando a desejar há uns quatro Sul-Americanos. mas isso foi alertado. É uma questão de planejamento da CBF com os clubes. São liberações de atletas. períodos de treinamento reduzidos. Muitos jogadores da sub-20 não jogaram com a camisa da Seleção e já vão para o Sul-Americano. Por exemplo, eu tinha o David Neres no Sul-Americano com uma convocação. Foram 45 minutos de um amistoso contra o México e ele teve que voltar de voo fretado para defender o São Paulo.

Maiores campeões sul-americanos sub-20

11118855331111BrasilUruguaiArgentinaColômbiaParaguaiEquador02,557,51012,5

Colômbia
3
Maiores campeões sul-americanos sub-17
1212331111BrasilArgentinaColômbiaBolívia02,557,51012,515

Sub-17 x sub-20

Ao menos até a último sábado, o cenário era bem diferente na sub-17, que só viu dois títulos escaparem em 25 anos. Só que veio a derrota por 3 a 0 para a Argentina – e a inédita eliminação na primeira fase da categoria (o Brasil, ao menos, está classificado para o Mundial, em outubro, por se tratar do país-sede). Mas aqui é bom destacar alguns pontos. O time de Guilherme Dalla Déa esteve ao lado das principais forças do continente na chave e ainda somou os mesmos sete pontos de Uruguai, Paraguai e Argentina, os outros classificados.

– Não é falta de qualidade do jogador. A sub-15 e sub-17 ainda conseguem juntar quase todo o grupo, fazer mais convocações, olhar os atletas com tranquilidade. Mas na virada para o sub-20 eles já estão migrando para o profissional. Com 17, 18 anos são negociados. Não tivemos Vinicius, Paulinho, Matheus Cunha, Rodrigo Guth (atacante e zagueiro, respectivamente, ex-Coritiba), Mauro Junior (ex-Desportivo Brasil), tivemos lesões do Alan, Victor Bobsin, do Yuri Alberto. Não temos data Fifa e para os clubes brasileiros liberarem seus jogadores é uma negociação muito grande – disse Amadeu, demitido após a eliminação do Sul-Americano Sub-20 deste anos, em entrevista recente.

 

–:–/–:–

 

Brasil perde para a Argentina e está fora do Sul-Americano sub-17

Brasil perde para a Argentina e está fora do Sul-Americano sub-17

Antes de ver mais uma vaga para o Mundial escapar, a quarta na história e terceira na década, Amadeu comandou a grande geração de Vinicius Junior no título sub-17 há dois anos no Chile. Depois, no Mundial (sem o atacante do Real Madrid), acabou na terceira colocação. A queda inédita neste ano mostra que o nível caiu e, ainda que tenha jeito de um acidente de percurso, liga o sinal de alerta.

 

–:–/–:–

 

 

–:–/–:–

 

eiro